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terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

PARA UMA FILOSOFIA ESPÍRITA DA EDUCAÇÃO (Capítulo 2)

Prof. Humberto Mariotti

1. A Educação Espírita e o Novo Conceito do Ser

Educar é transmitir ensinamento e instrução tanto à criança como ao adulto com base num programa de estudos. As matérias que o constituem correspondem a conceitos científicos, sociais e religiosos dominantes, quer dizer que são matérias tendentes a conformar um tipo mental de homens que não discorde ou destroe das modalidades sociais tradicionais. É um ensino baseado em interesses humanos e não no conhecimento do indivíduo, nem está em relação com a verdadeira natureza e contituição do homem.

Por exemplo, no ensino oficial não se menciona de maneira alguma o conceito de perispírito, por não concordar com a instituição religiosa aceita pelo Estado. De maneira que apenas com este fato se coloca a enorme tarefa que tem de enfrentar a Pedagogia Espírita, que deverá lutar tenazmente com os velhos conceitos educacionais a fim de elaborar um plano de ensino baseado na Filosofia Espírita do Homem.

A chamada Universidade Nova, pelo grande trbiuno argentino Dr. Alfredo L. Palacios, abandona já os últimos elementos escolásticos e se inspira numa filosofia do ensino que possa abarcar asnovas dimensões do Conhecimento. A escola kardeciana não é apenas um saber metafísico e metapsíquico, mas uma pedagogia para a Humanidade. A própria estrutura da obra de Kardec, sobre todo a do Livro dos Espíritos, foi elaborada segundo o método dialogístico, o mais propício a uma penetração educacional no indivíduo. Com isto queremos dizer que o kardecismo foi elaborado com disposições declaradamente pedagógicas, pois não se esqueça que o próprio Kardec era um excelente educador da escola de Pestalizzi, razão pela qual o Espiritismo se acha ante a oportunidade de introduzir na Universidade Nova os seus luminosos postulados educacionais.

A luz do Espiritismo o ser humano reclama um novo tipo de ensino primário, secundário e superior. Os teóricos da Filosofia Espírita devem, pois, estruturar programas de ensino, como o seu respectivo desenvolvimento, produzindo ao mesmo tempo uma bibliografia renovadora que demonstrará o gênio pedagógico do kardecismo. Lembre-se que a Pedagogia oficial será sempre inadequada para oferecerum ensino baseado na concepção espírita do Ser. Basta pensar na posição antipalingenésica da mesma para compreendermos a distância em que se encontra do ensino espírita. Se com Locke ela sustenta a tese de que não há idéias inatas e que o Espírito é uma folha em branco, uma tábula rasa, segundo comenta o distinto pedagogo Juan Montovani, nada se pode esperar do ensino oficial. De acordo com o seu conceito de disciplina formal pode-se conformar um indivíduo segundo as conveniências do Estado, com o que se desnaturalizam as tendências inatas do mesmo, ou seja, o senso espiritual da criança e do adulto e se embaraça o seu livre desenvolvimento mental.

Esta a razão que nos obriga a elaborar uma Pedagogia Espírita baseada no conceito palingenésico do homem e da sua contribuição ternária, tal como o tem comprovado a investigação mediúnica. A Pedagogia que o Espiritismo nos proporciona contribuirá sem dúvida para a liberação do individuo do ponto de vista moral e espiritual, com suas repercussões sobre a vida social. Porque a Educação Espírita formará um novo tipo de humano, ou seja, o que já temos chamado de néo-homem, apoiado no evolucionismo do Ser através das vidas sucessivas e da reencarnação dos espíritos.

A evolução técnica e científica do mundo moderno exige um conceito de evolução coerente e profunda do homem, considerando como uma entidade espiritual e existencia. Poderia dizer-se que a chamada rebelião juvenil tem as suas raízes nos áridos e decadentes programas de estudo que nada dizem acerta do homem como Espírito encarnado. A propaganda do ateísmo é alarmante nas mais importantes universidades do mundo, a tal ponto que em duas norte-americanas foi necessário recorrer ao Espiritismo para que os estudantes voltassem a pensar no Ser Supremo e no destino da Humanidade.

As duas Universidades dos Estados Unidos a que nos referimos são a Dartmouth College e a Swartmore College, nas quais, diante do ateísmo que se espalhava entre os estudantes como ideologia, seus diretores resolveram convidar o distinto espírita e médium inglês, Prof. Horacio Leaf, que fez exposições filosóficas e religiosas baseadas no Espiritismo e demonstrações de fenômenos mediúnicos aos quais assistiram os alunos em grande número, e por cujos felizes resultados muitos deles voltaram a considerar possível a existência de um sentido transcedental para o homem e o Universo. Escreve a respeito o Prof. Horacio Leaf:
Esta consagração do Espiritismo por duas Universidades tão importantes mostra toda a sua significação na opinião daqueles homens do mundo acadêmico oficial que se propuseram a combater o materialismo.
Evidentemente nenhum outro movimento religioso pode suprir a esta urgente necessidade, pois não há dúvida que os dirigentes das diversas correntes religiosas teriam prazerosamente contribuído com a sua ajuda, se lhes houvessem pedido, mas já foram postas à prova e falharam (1)

Com efeito, sobre o Movimento Espírita recai agora, através de seus elementos intelectuais e universitários, o trabalho de elaborar programas de estudo que correspondam às conquistas gnoseológicas dos novos tempos. Não se poderão esperar grandes êxitos nas casas de estudos espíritas se não se elaborar uma Filosofia Espírita da Educação e os respectivos programas a desencolver.

Considere-se quanto é urgente e real o que dissemos se tivermos em conta a missão terapêutica dos médiuns curadores e a dos hospitais espíritas. Isso nos demostra que é iminente a presença do médico espírita com seus métodos terapêuticos nestes novos tempos, pois o que chamamos de medium-terapia só adquirirá importância científica quando se demonstrar a sua aplicação por meio de médicos que se formaram apoiados no conhecimento espírita do homem.
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(1) De El Sentimiento Religioso en las Universidades de Estados Unidos, publicado em Psychic News, Londres, 1955.


2. A concepção kardecista e o humanismo pedagógico

Este novo humanismo, elaborado na base de relações fraternais entre professores e alunos, poderia estabelecer-se em razão das três premissas seguintes:

1 - A Educação Espírita deverá preparar e capacitar o homem, demonstrando-lhe que é um Espírito encarnado que evolui palingenésicamente, o que o ajudará na luta contra a imperfeição humana, contra o ceticismo e niilismo e até mesmo contra a idéia da morte e do nada eternos, como o sustenta o existencialismo ateu.
2 - A Educação Espírita capacitará o intelecto humano a compreender Deus e suas leis, assim como a Mensagem Evangélica e a personalidade de Jesus, com o mais amplo espírito filosófico, racional e científico, o que determinará no homem uma nova visão do seu destino metafísico e da História Universal.
3 - Os professores e acadêmicos espíritas penetrarão, pelos ensinos do Espiritismo, no mais profundo do Espírito encarnado para nele descobrir o grau de evolução alcançado, o que lhes permitirá dar-lhe ensinos de acordo com a sua capacidade de assimilação nessa fase de sua evolução, sem violentar a sua inteligência com noções, conceitos e questões anti-racionais que não encontrem ressonância em seu estado anímico e intelectual.

Domingo Faustino Sarmiento, o grande educador argentino, aspirava a uma democracia social no tocante a métodos de ensino. Seu pensamento liberal buscava uma escola onde educador e educando se irmanassem em virtude dos progressos da cultura e da civilização. Por isso falava de "civilización y barbarie". A Pedagogia Espírita pode introduzir nessa democracia sarmientana a doutrina kardeciana de aristocracia intelecto-moral, que não é mais do que consequência espiritual da concepção palingenésica do homem, inspirada pelo Espiritismo.

Esta néo-aristocracia nos levaria a um novo conceito ético do ensino, fazendo-nos ver que o popular deverá estar apoiado no espiritual, pois cremos que uma pedagogia social sem o conceito espírita do homem faria sempre cair a educação no ceticismo e no materialismo. Porque toda pedagogia baseada em interesses sociais e em previlégios estará respondendo a concepções antigas. Por exemplo, o Universo para a Universidade católica continua sendo o que o dogma diz a respeito, já que afastar-se dele significaria a negação ou a desconsideração da cosmologia escolástica. Ao contrário, a Filosofia Espírita da Educação não tem crenças dogmáticas a defender, desde que o seu saber se nutre da verdade conquistada pela experiência. Neste aspecto o Espiritismo está de acordo com o pensamento de José Ingenieros(2) no que respeita ao conhecimento, o qual se elabora pela atividade renovadora do homem e da sociedade, sem cair nunca nessa posição de que todo o tempo passado foi melhor, segundo dizem os versos da Copla a la muerte de mi padre de Jorge Manrique (1440-1473). Por isso dizia Ingenieros à juventude do seu tempo:
Repeitai o passado na justa medida dos seus méritos, mas não o confundais com o presente nem busqueis nele os ideais do porvir: não é verdade que todo tempo passado foi melhor. Olhai sempre para a frente, mesmo que vos equivoqueis: mais vale para a Humanidade equivocar-se numa visão de aurora do que acertar num responso ao crepsculo. E não duvideis de que outros, depois, sempre, olharão mais longe: para servir a Humanidade, a sua pátria, a sua escola, a seus filhos, é necessário crer firmemente que todo tempo futuro será melhor.

Este mesmo é o espírito da Filosofia Espírita, e por essa razão é ela a mais adquada a renovar as matérias do ensino e propiciar um novo ideal aos estudantes. Hoje a ação social da Universidade repercute no povo e o Espiritismo, como ciência do Espírito encarnado e desencarnado, deverá orientá-lo, como ser coletivo que é, para a paz e a justça, elaborando uma educação filosófica e religiosa que renove totalmente as bases do conhecimento universal.

E quando aparecer, como uma realidade social, a Universidade Espírita não só dará professores úteis ao progresso cultural e técnico da sociedade, como dela sairão homens dignos, moralizados e idealistas, formados nas bases doutrinárias do Espiritismo. Porque ela não se ocupará somente de formar doutores, engenheiros, arquitetos, etc., mas também de educar espíritos através das noções científicas e religiosas do kardecismo. E esta dupla tarefa da Universidade Espírita, fundada no experimental e no ético, contribuirá para renovar a sociedade pela influência que esses mesmos homens exercerão sobre ela, com seus exemplos de hombridade moral e espiritual.
(Buenos Aires, 1970)
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(2)Ingenieros, Proposiciones Relativas al Porvenir de la Filosofia.

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